Lá vai ele vestido em seu manto maltrapilho, usado em dias assim de céu cinzento.
Tem um guarda-roupa particular:
Nos dias ensolarados, bermuda, peito desnudo e no ombro sua vida de contornos indecifráveis. Ao vir à chuva, um capuz sobre a cabeça completa sua vestimenta escura e sombria.
Nos dias ensolarados, bermuda, peito desnudo e no ombro sua vida de contornos indecifráveis. Ao vir à chuva, um capuz sobre a cabeça completa sua vestimenta escura e sombria.
Perambula por todas as estações do ano com seu cajado e um cobertor enrolado, pendurado em seu ombro feito um alforje. Inseparáveis!
Ele e seus pertences são um só, a caminhar a ermo na avenida Luis Dumont Villares.
Com pés descalços volteia as estações do metrô carregando o silêncio de um eremita.
Evita as pessoas, não fala com ninguém, mas sua voz ecoa através das janelas dos escritórios.
Um grito de solidão!
Um grito de solidão!
Quando o sol escalda o asfalto, o canteiro gramado lhe oferece um sofá de pedra sem a sombra das árvores.
Ali ele senta-se como um rei, coloca seu tesouro ao lado e medita;
sua pele reluz ungida em suor, horas a fio; como se não sentisse o calor.
Recusa a sombra da árvore; talvez a visse como intrusa no seu deserto, que pudesse roubar seu coração. Talvez já a conheça tão bem e já viva em sua própria sombra de ilusão.
Parece alimentar-se de pensamentos; enquanto alguns curiosos alimentam-se de julgamentos, mas no fundo invejam aquele poder de concentração.
Quando o sol se põe e o céu se fecha, ele se ergue como das profundezas da sua alma vitorioso e cheio de si. Não transparece nenhuma dor.
Ninguém sabe o que o leva a seguir pela chuva que cai, sempre na mesma ação.
Alguns já disseram que na calada na noite, às vezes fica nu, e pragueja quem se aproxima dele.
O chamam de louco e atormentados por sua nudez ébria; seu sexo exposto; livre pela avenida...Chamam à autoridade , cuja sirene reconhece como barulho de algemas.
Reage com soberba de um rei; arrogância sem ganância e prepotência de quem não precisa de ninguém.
Acredita-se que lhe dão um banho, tosam seu cabelo, alimentam sua barriga magra e o devolvem à avenida. A quem diga que apanha também.
O dia amanhece e lá está ele novamente vestido do seu tesouro; caminhando a ermo por sua imensa casa, como a medir sua extensão pra saber se tudo continua estático. E ele como único ser, se movimenta.
A chuva molha as vidraças e o mendigo eremita. Ninguém se importa. Ninguém lamenta.
Nem ele.
Talvez o mundo o tenha abandonado e talvez ele tenha abandonado o mundo.
Quem sabe se a avenida é a única amiga que escolheu?
Só ela conhece seu nome,seu pisar, seus segrêdos e sua voz.
Só ela entende seus nós em seu olhar perdido, misterioso, mas... Profundo.
Elaine Barnes
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